sexta-feira, 23 de fevereiro de 2024

Você já pensou em viver hoje?

Completando o último post, porque na verdade meu post de ontem ficou incompleto.

Meu post de ontem foi um descarrego.

Às vezes, eu me pergunto muito sobre como seria a minha vida sem mim, sobre como me tirar da equação. Houve alguns momentos em que eu realmente tive vontade de dar cabo. Em 2000, no meu terceiro ano, que acho que foi o primeiro ano realmente ruim para mim - e sem ter ninguém com quem desabafar ou conversar sobre na época. Em 2005, quando estava me aproximando da reta final de uma graduação que odiava e me sentia pior do que o cocô do mosquito que picou o cavalo... se bem que quando eu penso em mosquito hoje, e depois de ter lido uma matéria sobre como os mosquitos são animais muito letais em razão de todas as doenças que transmite (dengue, malária, zika, chikungunya e sabe-se lá mais quais...)... e em 2010. Em 2010, eu me sentia muito muito muito culpada. Entrei numa espiral louca. Revivi as últimas conversas com meu pai, pensando em todas as vezes que eu devia ter prestado mais atenção nele, que eu devia ter sido pró-ativa e perguntado mais... tudo isso enquanto eu via minha mãe tendo os mesmos questionamentos, e eu tentando passar uma imagem fria de que ela não devia pensar nisso, sendo que eu também só pensava nisso... véi, tanta coisa que eu falo pra fora completamente diferente do que eu penso por dentro... quantas vezes eu ñ dirigi torcendo para que houvesse um rompimento da barra de direção e eu vivesse a minha própria Tamburello?! Óbvio que eu queria que fosse sempre por um acidente, por algo externo, porque não queria que ninguém questionasse as coisas que eu estava questionando naquele momento.
Mas, não, eu nunca vou encerrar com a minha própria vida. Isso eu prometi lá atrás quando eu prometi que nunca levaria um problema para minha mãe, depois de ter visto quanta culpa ela carregou por tantos anos sozinha sem precisar. Ela nunca me pediu isso, foi minha escolha. Mas isso fez com que eu entubasse todos os meus sentimentos negativos e lidasse com eles sozinha, ruminando.
Eu tinha um diário da Polianna, somente das coisas boas. Eu só externava as coisas boas enquanto deixava meus fantasmas interiores me dominando.
Isso nunca me ajudou.
Com o tempo, com os blogs - e nada mais delicioso do que o suposto anonimato público da internet -, eu comecei a expulsar meus demônios. Meus blogs secretos são válvulas de escape para que os fantasmas não precisem ser enterrados e eu os viva até que estejam prontos para ir embora. E, depois, quem sabe passados 10 anos, eu os revisite e fique feliz em saber que eles se foram.
O post de ontem era um monólogo, sobre a importância de extravazar, de botar o lixo para fora de casa em vez de ser um acumulador, numa metáfora bem prática. Se você não dá um jeito de tirar o lixo de você, chega uma hora em que você fica asfixiado. Você precisa botar o lixo pra fora e você deve fazer isso. Se você não quer ser um peso para ninguém, você tem de ter confiança em botar o lixo para fora. O ideal é que você o faça com um profissional. Quando você dá nome e trabalha com seu lixo, você recicla, você deixa a energia fluir, até ir embora. Nesse ponto, até a ilha sujimon é um exemplo lindo de como a gente precisa aprender a lidar com nosso lixo interior.
Você não precisa ser um Ichiban. Ninguém espera que você o seja. Ninguém (exceto talvez um filho) espera que você seja um paladino, um mártir, um herói. Então, tira a armadura, tira o seu excesso de peso.
Se você tem medo do que vai externar, tenho um blog secreto, fale cifrado, mas fale, mas tenha coragem de assumir até o seu pior pensamento. Porque quando você canaliza esses pensamentos em palavras ou image s ou qualquer coisa do gênero, você reorganiza suas emoções. E isso, isso sim faz toda a diferença.
Ninguém desabafa pedindo solução pra própria vida. A gente desabafa pra diminuir o monte de lixo dentro da gente, até a gente conseguir organizar o lixo e reaproveitar o que dá.
Agora saindo da mensagem criptografada aqui, vou continuar meu desabafo de terça. 
Estou batendo pino. Eu não consigo mais. Estou batendo pino. Cheguei àquele ponto em que cada segundo acordado da minha vida está tomado. E sob essa óptica, eu vejo todos os pratinhos girando devagar nos palitos, prestes a cair.
Estou avisando que estou batendo pino. Estou demonstrando que estou batendo pino. Falhas sucessivas em casa, falhas sucessivas no trabalho, falhas sucessivas com meu filho, falhas, falhas, falhas. Eu estou mandando SOS mas não é da maneira que pensam. Estou avisando que estou pifando. Eu preciso dividir as tarefas, principalmente a carga mental, porque eu preciso focar no prato que sustenta todos os meus pratinhos: meu eu. O fato de eu me sentir péssima comigo não é para que venham me dizer que estou ótima do jeito que estou ou que é o efeito da grande angular. O segredo da distorção da grande angular é que ela distorce apenas quem está nas pontas. Quem está no meio das fotos não tem distorção quase nenhuma. Aquela é minha imagem. Minha autopercepção foi sendo desligada nos últimos anos porque sempre foquei nos outros. E esquecia de mim. Mas se eu não focar no meu pratão, no casco da tartaruga gigante que é a base do Discworld, todo o mundo que depende de mim vai desabar (obviamente, vai desabar somente até ele se reestruturar, porque a vida continua mesmo sem a gente).
Então eu preciso me sentir insatisfeita e infeliz comigo, porque é a insatisfação que move a gente. Tudo tem um limite, até chegar naquela gota que faz tudo transbordar e tira você de um ciclo vicioso de permanência no lixo.
Os ciclos de construção só se sustentam se houver ciclos de destruição para acompanhar.
O lance da minha exaustão é que justamente eu não estou tendo tempo para me organizar. Estou engolindo o lixo, ocasionalmente botando o lixo pra fora, mas estou chegando naquele ponto em que preciso respirar e organizar o lixo, porque meu porta malas está lotado. Eu tenho um apartamento de 110 metros quadrados cheio de lixo empilhado, mas não consigo sentar e classificar o lixo pra reciclagem porque toda hora acontece uma obra de contenção emergencial do apartamento, e nisso o lixo fica se acumulando.
E é isso. Quando eu vejo, eu já estou com tudo zoado de novo.
A frustração é grande porque eu reorganizei minha planilha para conseguir achar um tempo diário para mim e é esse tempo diário que estou abdicando para lidar com as emergências, porque meu custo de funcionamento já está altíssimo.
Hoje conversei com meu marido sobre a delegação de tarefas. Hoje ele divide muita carga comigo, especialmente se comparado a 8 anos atrás, mas a vida da gente exponeciou de um jeito que isso só está fazendo cócegas. Mas como podemos delegar mais? Como podemos otimizar os processos?
Sabe o que faz falta? O Bonde. O que faz falta é fazer coisas para nós mesmos sem ser uma obra de engenharia cada interação. Eu pedi um final de semana no mês como família. Largar tudo no estado em que se encontra para tirarmos um tempo para sermos só nós.
Precisamos viver.
Você já pensou em viver hoje?

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